sábado, 18 de fevereiro de 2012

Quando ele voltou pra casa...

Ele chegou em casa, fazia um bom tempo que eu não o via. O cabelo cortado e a barba feita foram as primeiras coisas nas quais reparei, parecia e parece mais magro também. Vestia roupas simples, uma camisa azul escura e uma calça de moletom preta, mais uma daquelas roupas que a gente compartilha e nem percebe. Não deu uma hora e ele começou com suas brincadeiras, ria da nossa cara quando perguntávamos se estava bem, e quando perguntávamos se precisava de algo fazia cara de dor, colocava a lingua pra fora e começava a falar embolado, como se estivesse tendo um troço. Escondeu as cicatrizes na perna e no peito pro dias, porque sabe o quanto eu tenho, como ele, problemas com cortes.
Poucos dias depois começou a responder que queria comer um X-Tudo com bacon dobrado, ou quem sabe uma pizza quatro queijos. Comeu doritos logo na primeira semana - pegou o pacote, olhou pra mim com um sorriso que parecia mais um menino, e comeu feliz da vida, o seu único doritos. Depois bicou refrigerante de mim, e do meu irmão menor também, sempre com a mesma cara safada.
A princípio, eu fiquei curioso... Não tive vontade nenhuma de repreende-lo, apesar de que veio na minha cabeça - "Porra, esse cara não se cuida!". Entretanto as brigas que meu irmão aprontava, não sei se ajudam. Acho que não. Todo mundo acha que "quase morrer", ensina muito a viver, que tudo muda depois de uma experiência dessas. Não, não muda tanto.

A vida não vale tanto. Não vale por si só. O preço de todas as proibições é alto demais somente para a continuidade da existência - não se pode pagar a vida, compensa-la, "viver melhor", apenas se vive e ponto, independente se "quase morremos" ou não...

Prefiro vê-lo sorrindo, demonstrando seus pontos de vistas, sua cores e mundos, à sua maneira, do que triste por ver que não o entendemos. Que o achamos um cabeça dura, que não presta atenção ao que dizemos e que não se cuida direito. Que somos incapazes de ouvir o senso de responsabilidade para com seus alunos, sua força de vontade de continuar em frente até o ano letivo acabar, mesmo depois do coração e do pulmão já estarem a muito reclamando.

"Japonês demais", eu provavelmente diria, ou disse.

É um cabeça dura mesmo e não ouve nem a nada. Mas passei a admirar muito o cuidado com que cultiva aquilo que tem a dizer, o que ele diria ao mundo, o que diz, o tempo todo. Por mais que consiga me compreender diferente, acho bonito o jeito como se expressa, bonito por si só, bonito por ser expressão dele, por ter a alma dele. É como se ele fosse uma música, e eu conseguisse ouvir, depois de muito tempo, um pouco de seus sons... O que ele diria ao mundo.

E a tranquilidade dele, a alegria dele, é mais importante do que sua saúde. Com isso ele se arranja, ele se cuida, mesmo que faça isso de uma maneira muito peculiar.

Não precisa de um conselho, precisa de um abraço.

E só...


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